A ideia desse blog começou com 0 livro "O Clube do Filme", de David Gilmour, onde um rapaz desinteressado da escola é convidado pelo pai (crítico de cinema) a abandonar os estudos, desde que os dois assistissem juntos a pelo menos três filmes por semana. Minha esposa (na época namorada) Elaynne me presenteou com este livro, e decidimos fazer algo parecido: assistir a um filme por semana em casa.
Fizemos uma lista inicial de 36 filmes, sendo 18 escolhidos por mim e 18 por ela. Sorteamos um filme para assistir e já indicamos qual será o seu substituto na lista. Ou seja, isso não vai acabar nunca. Eu tomei a iniciativa de comentar os dois primeiros filmes que assistimos, daí criamos o hábito de comentar cada filme que assistimos, sendo que os meus filmes são comentados pela Elaynne e os dela, por mim.
Os comentários apresentam muitos spoillers. Por isso, se você gosta de surpresas, não vai gostar de ler nossos comentários. Se pra você tanto faz, ou se já assistiu aos filmes, aposto que vai se interessar em nossos comentários, mesmo que não concorde com todos.
Espero que curtam nosso interesse por cinema. Se gostou do blog, nos ajude a divulgar.

Carlos Henrique

14 abril, 2012

Amnésia (Elaynne)


Como eu lhe falei, estas críticas não são para explicar o filme, e sim para falar dele. Então, se você espera que eu dê alguma explicação sobre o filme, pode esquecer. Até porque eu não explicaria este filme nem que eu quisesse. É um filme que não é pra ser entendido. Pelo menos não na primeira vez em que você assiste. Pra entender o enredo, a trama, é preciso reassistir ao filme pelo menos umas duas ou três vezes.
E ainda assim, você não vai entender tudo. Ainda ficarão dúvidas no ar. Tudo pela maneira original e brilhante como o filme foi editado: de trás pra frente. Tem como dar certo isso? Onde é que já se viu, assistir a um filme do fim para o começo?? Mas... e não é que deu certo mesmo???
A primeira coisa que me chamou a atenção neste filme você já sabe qual foi: o diretor, Christopher Nolan, responsável pelo sucesso da trilogia Batman Begins. Só em saber que este era o diretor, já imaginei que Amnésia seria um filme bom. E não me enganei. Amnésia é um daqueles filmes que fazem sucesso no boca a boca, ou seja, no público, mais do que na crítica. Afinal, um roteiro tão interessante merecia ter uma indicação ao Oscar.
Quanto à Leonard, o que dizer dele? Sentiu na própria pele o preconceito que ele mesmo mostrou com Sammy. Passou a sofrer com o descrédito, desconfiança e falta de caráter das pessoas. Que tipo de pessoa tiraria proveito de uma pessoa na situação dele, com o problema dele?? Pelo jeito, muitas pessoas. Aquelas que tinham problemas a serem resolvidos e não queriam se sujar. Aquelas que querem ter alguém que faça o trabalho sujo em seu lugar.
Neste ponto, Lenny era perfeito. Poderia fazer o que quisessem, pois sempre estaria agindo em nome da sua própria honra, e da sua esposa. Estaria agindo em nome da “justiça”. E depois, não iria carregar aquela mágoa, aquele trauma e sofrimento pelo resto da vida. Em menos de 15 minutos, ele esqueceria tudo e partiria para uma “nova” vingança, que sempre era a mesma.
Pra ser bem sincero, não é preciso ter perda de memória recente para encontrar aproveitadores em todos os lugares. Pessoas que se aproximam de você porque querem tirar de você o máximo possível, querem sugar sua vitalidade, alegria, autoconfiança, bom humor, ou seja, tudo de bom que você tem e que elas não têm. E quando não dá mais pra sugar nada, te abandonam, te deixam à própria sorte.
O pior, neste tipo de pessoa, é que elas se apresentam extremamente agradáveis, se identificam com seus problemas e, em alguns casos, até passam ou já passaram pelas perdas e frustrações as quais você já passou. Natalie é uma pessoa desse tipo. Perdeu alguém que gostava, e usou isso para que Lenny se identificasse com ela e acabasse matando a pessoa que, TALVEZ, foi a única que tentou ajudá-lo de verdade: Teddy.
Mais como nem tudo neste filme é o que parece, eu disse TALVEZ. Pois, com o desenrolar dos fatos, com a história do filme se aproximando do início, percebe-se que Teddy não estava tão interessado assim em ajudar Leonard. Afastar Lenny de Natalie pode ter sido a única coisa boa que Teddy tentou fazer. No mais, tudo o que ele fez foi se aproveitar do problema de Leonard, como todo mundo.
E por se aproveitar tanto de Leonard, Teddy acabou cavando a própria cova, pois em um momento onde tudo foi revelado, Lenny forjou a prova de que Teddy seria o Jhonny G. a quem ele tanto procurava. A placa do carro de Teddy tatuada em seu corpo o levou a matá-lo, acreditando que Teddy fosse o assassino de sua esposa. Teddy também caiu na própria armadilha.
O que me faz pensar o seguinte: se o filme fosse contado de onde começou em diante, e não pra trás, provavelmente Natalie teria o mesmo fim que Teddy. Por se aproveitar de Lenny, em algum momento ele conseguiria anotar algo que ela fizesse de ruim, e criaria também uma prova contra ela, e Natalie seria mais uma a morrer pelo assassinato da esposa de Lenny. Quem vai saber?
A única coisa que se pode saber, com certeza, é que viver sem memória é viver escravo de aproveitadores, de anotações, fotos, de um modo de vida sistemático que, no dia em que você fugir dele, você se perde. Viver sem memória é viver uma vida sem história. E o que seria de nós se não tivéssemos histórias pra contar, “causos”, situações, lembranças boas e ruins. É todo este conjunto de lembranças vivas em nossa mente que nos torna seres humanos, que nos faz agir por vontade, por desejo, por emoção e por razão, não apenas por instinto. Como diz o profeta Jeremias, no Livro das Lamentações, cap. 3, vers. 21: “Quero trazer a memória aquilo que me dá esperança”. Ter o que lembrar, ter o que comentar com alguém, é o que nos dá esperança de viver um novo dia para ter novas histórias, para que possamos nos renovar.
Uma vida sem memória é uma vida apagada. Quase uma inexistência. Porque viver se tudo o que você faz desaparece em 15 minutos?
A vida de Lenny é assim. O filme explora bem isso. Como Teddy falava sempre para Leonard, “você nem sabe quem você é agora, quem você se tornou depois do acidente”. E era verdade. Lenny não sabia quem era, quem poderia ser um dia. E no fim do filme (ou no começo) Lenny fica inclusive em dúvida de quem ele foi antes do acidente. Seria ele mesmo Leonard Gelby, um investigador de uma seguradora, ou seria tudo isso fruto de sua imaginação? Perguntas sem respostas. Melhor deixar assim mesmo. Dá ao filme um ar de inacabado. E faz com que seja uma obra brilhante.


04 abril, 2012

Doze homens e uma sentença (Carlos)


Quanto do nosso tempo vale a vida de alguém? Essa talvez seja a primeira pergunta que fazemos ao assistir "Doze homens e uma sentença". O filme já começa com os 12 homens que compõem o júri, pessoas comuns que não se conhecem e nunca se viram, entrando numa sala para se reunir e decidir pela condenação ou absolvição de um jovem porto riquenho de 18 anos à pena de morte por ter possivelmente matado seu pai. Não nos é mostrado o que aconteceu no julgamento e nem a morte.
Já reunidos vem a grande pergunta para o grupo: inocente ou culpado? A maioria começa a levantar a mão o condenando, então um por um vão levantando aos poucos até completar 11 com as mãos levantadas, porém o que chama mais atenção nessa parte não é o fato de um não levantar, mas sim que alguns daqueles homens não tinham a certeza se ele era mesmo culpado, porém dois motivos os levavam a votar: o primeiro era a vontade de ir embora logo e se livrar daquilo, como tinha que ter unanimidade melhor ir com a maioria afinal eles tinham outros compromissos; o segundo é o medo que temos de contrariar, isso nos leva na maioria das vezes a ir com a maioria só por medo de argumentar e de ser mal visto pelos outro. Percebe-se nessa hora como o idoso olha para todos e levanta o braço timidamente. Na certa ele se encaixou bem nesse segundo motivo.
Como não houve unanimidade logo de primeira, afinal Davis levanta a mão inocentando-o, os outros que queriam ir embora logo e nem ligavam para o que estava acontecendo protestaram e quiseram discutir logo. Todos expuseram seus  argumentos e à medida que falavam a gente também pensava: "como pode esse homem o achar inocente?". O problema é que Davis não o achava inocente, apenas queria discutir mais, pois achava que a vida daquele jovem não poderia ser decidida assim em um minuto sem discussão. Então Davis começa pouco a pouco a mostrar o que poderia estar errado naquela prova apresentada, e o primeiro a se convencer da inocência do jovem é exatamente o idoso que mal levantou a mão, o que só demonstra que ele precisava de mais alguém para o apoiar.
Percebemos ao longo da discussão a característica de cada um: temos o idoso que sofre por não ser escutado, temos o tímido, o intelectual, o imigrante, o preconceituoso, o que sofre com o descaso do filho, o que só pensa em assistir beisebol e assim por diante. E percebemos como podemos deixar que nossas características nos levem a julgar as pessoas  apenas pelas suposições e por nossos conceitos adquiridos. Como não queremos pensar quando o assunto é o outro.
Aos poucos todos vão se convencendo da inocência do jovem. Eles vão vencendo seus preconceitos e arrogância. Mas será que o jovem era mesmo inocente? Se no começo achávamos com certeza que ele era culpado, no fim, como os jurados, acabamos nos convencendo também da sua inocência. O diretor inteligentemente não nos diz a verdade e o suspense prevalece até depois do filme, afinal o importante não era saber se o jovem é culpado e inocente e sim mostrar como podemos decidir em grupos, onde todos são bem diferentes e pensam diferentes, todos têm que ser escutados, todo argumento tem que ser respeitado, todos têm que deixar de lado seus orgulhos, todos têm que expressar sua opinião sem medo.
Uma parte que chama a atenção durante a discussão é quando alguém pergunta a Davis por que o advogado do rapaz não questionou as provas assim como ele. E a resposta infelizmente é a verdade, afinal provavelmente era um advogado de defesa publica que não ganharia grande status pela aquela causa e já a considerava perdida. E fica a grande questão sobre a advocacia no mundo. O que vale mais para um advogado: status e dinheiro ou a vida do ser humano? Por que alguns advogados por milhões inocentam culpados e não se esforçam para livrar inocentes?
E claro que não poderia deixar de citar o fato curioso do filme, pois ele se passa praticamente todo numa pequena sala, apenas uma cena no começo do filme, uma no final e duas no banheiro não ocorrem lá, o que mesmo assim não deixa o filme monótono.